No
Brasil estamos acostumados aos rótulos sociais que surgem e são amplamente
divulgados, aceitos e ostentados de ano em ano. Já tivemos os “cara-pintadas”,
os “manifestantes”, os “rolêzeiros” e, hoje, temos os justiceiros.
A
acepção da palavra justiceiro nos remete ao conceito de justiça, de quem faz
justiça, o que, neste caso, seria efetivamente algo muito bem vindo devido a
atual situação de nosso país, onde convivemos com o medo, a miséria, o
desrespeito por parte dos entes públicos, a falta de educação e civismo
apresentada por grande parte da população, enfim um momento caótico para a sociedade.
No
entanto as pessoas que estão sendo rotuladas como “justiceiros” não representam
a justiça, não são membros do poder judiciário, tampouco manifestam em seus
atos o conceito de justiça ou lutam conscientemente por esta.
Uma
definição simples da palavra justiça seria: “Prática e exercício do que é de direito”. Por
entender justiça como um conceito mais amplo e abrangente trago Aristóteles, que
defendia a Justiça como “virtude”, associando legalidade e igualdade.
O
que temos visto na mídia em hipótese alguma pode ser chamado de justiça! Sendo
assim, nominar os assassinos e espancadores que promovem as cenas mais torpes e
indignas de qualquer sentido de humanidade de justiceiros está equivocado.
Estamos diante de bandidos que se acham no direito de exterminar quem eles
consideram bandidos.
É
confortável justificar as atrocidades que vem sendo cometidas por estes grupos
de ensandecidos, nas ausências e ineficiências do estado, afinal é dele a
responsabilidade por não nos expor à violência. A ineficiência dos governos tem
contribuído para geração de toda descrença e desespero que usamos para validar
os comportamentos irracionais apresentados por estas pessoas, mas ainda assim
tal comportamento pode ser justificado?
Neste
caso é muito importante que entendamos que estas ações de linchamento e
massacre em nada têm a ver com justiça, mas sim com um sentimento de desforra,
de revide que, ao invés de ser canalizado e utilizado para realmente se exigir
o cumprimento das funções de governo, ao invés de ser usado para fiscalizar e
reivindicar o cumprimento rígido das leis de nossa constituição, dos direitos humanos
universais e do estatuto da criança e do adolescente, é simplesmente usado para
acobertar o instinto animal e covarde daqueles que não são nem justos nem
corajosos para mudar seu status quo.
Sou
favorável aos justiceiros, mas àqueles que exercem o papel legal de julgadores
e executores das leis, e são constituídos e formados para isso. Sou a favor dos
justiceiros, dos homens e mulheres que dedicam suas vidas para verem cumprida a
legislação que garante direitos e deveres, pessoas que lutam por causas que
beneficiam a sociedade, causas que dão dignidade e respeito a todos, e visam
corrigir injustiças.
Não
há justiça na vingança, na destruição da vida humana, na agressão física e
psicológica contra quem é suspeito de um crime, nem a quem já foi condenado pela comprovação de seu delito.Toda
pessoa deve receber a punição prevista em lei e ter a possibilidade de se
regenerar, se arrepender e mudar. A morte não muda o criminoso. O atual sistema
carcerário não reeduca o apenado. A ausência de políticas públicas e sociais
que garantam as condições mínimas para que o cidadão possa escolher não viver
do crime, não contribui para diminuir a criminalidade.
Vivemos
um dos momentos mais desordenados de nossa sociedade. Descrédito nos poderes
constituídos, nas instituições e no ser humano, tem nos feito adotar posturas
equivocadas, nos tornando inertes na maioria das vezes, ou animalescos em casos
extremos.
Somos,
enquanto partícipes da sociedade, muitas coisas, mas certamente o adjetivo
justo não nos cabe da forma como acreditamos. Se formos respeitosos uns para
com os outros, colaborativos e igualitários em nossas relações, cumpridores dos
nossos deveres e perseguidores dos nossos direitos, aí sim teremos condição de
promover a justiça que nos foi usurpada.
Marcos
Marinho
Professor
e Consultor político