Decidi ser franco com todos
os leitores deste texto e expor minhas versões da realidade política
brasileira. Claro que não julgo minha versão como a preponderante, a suprema,
mas sim uma versão dos fatos que passaram por lentes críticas, e foram catalogados
e alojados equidistantemente entre meus desejos particulares e a realidade.
Nasci ainda no período da
ditadura militar, mas não verso sobre esta fase, pois dela nada lembro, era
criança. Minha primeira recordação sobre política data de 1984, de um comício
do Movimento Diretas Já, mais iconicamente da figura de Tancredo de Almeida
Neves. Lembro-me de sua triste morte antes de assumir a presidência da
república, lembro-me de um bigodudo assumindo em seu lugar, e daí pra frente já
me lembro de muita coisa: maquinetas de remarcar preços nos supermercados, hiperinflação,
muitas donas de casa nervosas e muita, muita reclamação.
Volto um pouco no tempo, nas
imagens televisivas que formaram minhas primeiras impressões políticas, num
comício gigantesco com muita gente se abraçando e cantando, chorando, agitando
bandeiras, comemorando de uma forma tão entusiasmada que, hoje, me fazem
contestar a atual postura da sociedade frente à política. Foi por essa atual realidade
que eles lutaram, choraram e comemoraram?
Acredito que estamos
simplesmente colhendo aquilo que plantamos! E me refiro a todos os escândalos
políticos que tem nos assolado ultimamente. Nesta versão miro através de minhas
lentes os rostos corruptíveis de eleitores que assediam candidatos em troca de
benefícios próprios, e de candidatos que se prestam ao mesmo papel, só que na
ponta contrária.
Posso também visualizar
cidadãos que se eximem da responsabilidade de escolher, certo ou errado, seus
representantes e se empoleiram sobre os muros da democracia, atirando pedras
para todos os lados. Posso ainda perceber hordas de alienados se movendo ao
ritmo de “oi, oi, oi”, obcecados por folhetins espúrios que desconstroem todos
os valores morais que me foram ensinados, jovens pré-alcóolatras se formando em
“sertanejos universitários”, onde sua profundidade crítica e conhecimento
político são suficientes apenas para incentivar o abandono da responsabilidade
pelas escolhas, e replicar conteúdos desprovidos de relevância pelas redes
sociais.
Ainda bem que em minha
versão dos fatos ainda existem pessoas de coragem, que lutam contra regimes totalitários,
em vários locais deste mundo, onde até a morte é preferível à realidade, à falta
de direitos e à obrigatoriedade de anulação da individualidade. Pessoas que nos
ensinam que viver é mais do que sobreviver. Através de minhas lentes, também
enxergo jovens assumindo seu papel na manutenção da democracia, na retomada da
luta por um país melhor, pela cassação dos bandidos uniformizados com ternos
caros e gravatas de grife, da eliminação dos escroques escondidos no
funcionalismo público, nas entidades de classe, nas instituições sociais
públicas e privadas.
Em minha versão da realidade
não culpo a política, nem só os políticos, pelas decepções que acumulamos e
tentamos manifestar nos períodos eleitorais. Tenho consciência de que não somos
ingênuos! Faço mea culpa e assumo que
não sou tão ativista como gostaria, sou também entremeado de acomodações e
descasos peculiares aos que não precisaram arriscar suas vidas por seus
direitos civis, mas em minha versão da verdade sou capaz de mudar, de me
empenhar mais, de assumir meu papel na construção de uma sociedade melhor, sou capaz
de, muitas vezes, permitir que outras lentes me sejam postas para me mostrar
que existem outras realidades, que também compõem a realidade.
Marcos Marinho
twitter: @mmarinhomkt